Capítulo I: A aposta

O tempo nublado e carregado de nuvens impedia que os raios solares batessem sobre a pequena cidade litorânea de Coastmead. Era rotineira essa previsão de tempo, onde o mar parecia sempre bravo e prestes a avançar naquele minúsculo e misterioso município. O lugar é demasiado isolado, mas para Harry Styles que nascera lá, aquela aura o apaixonava. No entanto, o tempo era uma inspiração para quem ele apresenta ser. Cada vez mais ranzinza e insuportável, conseguia ser temido por muitos.

O lugar era tão isolado do resto do mundo e assustador que, apesar de se estar no século XXI, os habitantes mantinham-se presos no tempo com os costumes velhos e brutos. Suas construções eram antigas e caindo aos pedaços, além de viverem do lucro dos peixes e dos pequenos produtores e comerciantes, tudo muito manual. O posto de prefeito era sempre do morador mais antigo, até este morrer. 

Quanto ao turismo, não existiam muitos visitantes por aquelas bandas. Os poucos forasteiros que aventuravam-se eram surpreendidos por ameaças dos moradores ou assombrados por coisas macabras. No entanto, havia quem dissesse que o local era agradável e ótimo para se viver, assim como Harry.

Era de tarde quando, em uma esquisita ruela Styles, com um ar impetuoso, sentou-se na cadeira da barbearia vazia – a não ser pelo Robert, o barbeiro barbudo.

— Corte o meu cabelo. — Ordenou e o rabugento barbeiro vai até ele.

A única barbearia da cidade era maltrapilha e desorganizada, mas Harry não se importava, apenas queria que o seu cabelo logo estivesse pronto. O Robert em instantes começa a tarefa que lhe foi ordenada e, com uma navalha, tosca cada vez mais os fios do cabelo castanho encaracolado. 

Voz alguma era ouvida, somente um relógio de parede fazia tique-taque, tique-taque a cada segundo que passava-se. Styles achava um som agradável, no entanto o barbeiro estava nervoso demais e como gostava de jogar conversa fora – ao contrário de Harry – sentia-se desconfortável e pressionado. O cliente estava a inspecionar pelo espelho cada movimento dele com um olhar analítico e impassível, quem não ficaria nervoso?

Como se estivesse com uma bola de pelo na garganta, Ethan Hart, um ruivo alcoólatra e oportuno, grasne para que notem sua presença antes de entrar na barbearia. O que Harry sabe dele é que vem de família rica e sempre gasta todo o dinheiro de seu pai comprando bebidas e mais bebidas. Vive inventando apelidos toscos para todos e diz não ter medo de nada ou ninguém, típico de conversador.

— E então Barbudo, de que horas vai acabar esse corte? — Indagou sentando-se em uma cadeira empoeirada, ainda sentindo um pouco de ressaca da noite passada.

— Você tem dinheiro para pagar? — Robert mandou-lhe de volta e suspende o objeto que cortava os fios de Harry para o lado a fim de observar Ethan. 

— Consegui uma grana na taverna. Fiz uma jogada implacável no pebolim ontem, olha aqui. — O alcoólatra contou enquanto arranca da meia posta no pé esquerdo um saquinho de moedas.

— Certo, falta pouco para que eu acabe o de Styles.

O barbeiro afirma e volta à sua tarefa. Hart, que não havia reparado em quem realmente estava tendo o cabelo cortado, agora percebe que tratava-se de Harry. Como já haviam se esbarrado por aí e ele sabia que o marujo tinha o pavio curto para suas provocações, decide então tirá-lo do sério.

— Ora, ora, ora se aqui não está o pirata a aparar o cabelo. — Disse e Harry mantém-se calado diante do espelho. — Como vai o mar? — Continuou a provocar.

— Está melhor de saúde do que você. — O de olhos verdes murmurou.

— Isso é uma resposta bem vaga, não acha Barbudo? — Ethan virou-se para o com a navalha, esperando a resposta.

— Eu acho que você não tem a coragem que ele tem de ir para o mar. Já ouvi muitas histórias assustadoras de lá. — O Robert respondeu-lhe com a voz rouca por culpa do fumo, sem parar o seu trabalho.

— Duvido que ele tenha tanta coragem assim. Provavelmente só deve pegar rotas calmas — Ethan porfia com aparente certeza.

— Duvida mesmo, Ethan? — Styles olha-o em tom desafiador pelo espelho. 

— Claro que sim, pirata. — O conversador confirmou mais uma vez. — Se você realmente é bom, já deveria ter navegado nos mares mais traiçoeiros e encontrado a ilha de Eroda.

— Tá de brincadeira comigo? — Harry ri e pensa no quão longe a imaginação dele foi.

— Não, não estou. Surgiu um rumor por aí que John Lee, pai de Yellow, tinha ido e mesmo que não tenha conseguido voltar, conseguiu mandar uma garrafa onde tinha escrito as coordenadas do lugar. — Balbucia sério e mais uma vez uma risada ecoa no recinto.

— Isso é uma lenda, essa ilha nunca existiu. 

— Meu filho, a ilha existe sim. — Robert intromete-se na conversa.

— Você é marujo para saber? — Styles indagou com ironia.

— Meu avô foi. Ele também nunca voltou, mas o seu barco voltou. Todos que foram, apenas o barco voltou. Dizem até que as almas que foram precisam voltar com o barco para libertarem-se do mundo terreno. Eu entrei em seu barco, e a aura de lá é assustadora. — O barbeiro barbudo arregala os olhos, como se estivesse entrado naquele momento no barco que mencionou.

— Vocês estão loucos. — O desacreditado da história balança a cabeça em negação.

— Loucos? Você é que está com medo de ir. — O ruivo sorri da descrença.

— Está me desafiando? — Harry estreitou os olhos para o alcoólatra.

— Não está óbvio?

— Só me faltava essa…

— Vai amarelar então? — Ethan provoca e o de orbes verdes revira os olhos.

— Claro que não. De quanto é o meu prazo? 

—  Um mês. Se não for, me deve mil pratas. 

— E se eu for e achar, o que ganho com isso?

— Se isso realmente acontecer e você sobreviver, te dou o que quiser.

— Já venci — Avisa com certeza na voz. — Acabou? — Vira-se para o Robert, que confirma com a cabeça. Ele levanta-se e tira do bolso umas moedas. Joga-as na mão do barbudo e vai-se embora sem olhar para trás. Sabe dentro de si que conseguirá cumprir esse desafio idiota em um piscar de olhos, afinal de contas, é um bom marujo certo? 




Até a próxima!

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